Eram seis da manhã.
Seis e alguns quebrados para ser
mais específicos e ele, como de costume, estava atrasado. Caminhava a passos
largos, o frio da manhã lhe estapeava o rosto e fazia subir uma névoa branca de
sua boca a cada respiração. Quando dobrou a esquina, parou, vendo ao longe seu
ônibus partir. Chegaria atrasado ao trabalho. Novamente.
Caminhou, agora lentamente, até o ponto de ônibus do
outro lado da rua. Era inverno e pouco movimento havia naquela pequena cidade,
pra ser sincero, o único som audível no momento era o de seus passos contra o
chão irregular de paralelepípedo. Pensava em como explicaria para seu chefe que
havia perdido o horário novamente quando algo lhe chamou atenção. Alguém estava
sentado na parada de ônibus.
Ao se aproximar viu que era uma
moça, estava muito bem agasalhada, usava calça jeans, coturnos surrados pelo
tempo, jaqueta preta e uma toca que mostrava apenas parte do cabelo curto de
fora, o suficiente para perceber que era estranhamente azul. A principio ela
não esboçou nenhuma reação ao vê-lo, então, timidamente sentou-se ao lado dela.
- Aquele era meu ônibus. – Tentou
puxar conversa.
- Era o meu também. – Respondeu distraída a menina do cabelo azul.
- Também se atrasou?
- Não, estava tendo uns
pensamentos legais, então resolvi não interromper. Deixei o ônibus passar.
- Ah...
- Você coleciona borboletas?
- Oi?
- Borboletas. Você coleciona?
- Hum, não, eu... Porque a
pergunta?
- Por nada. Li em um livro uma
vez que é uma pergunta interessante a se fazer quando se quer conhecer alguém. –
Ela lhe olhou, como se pela primeira vez desde que chegou o tivesse notado.
- Qual livro?
- Não lembro, alguma história com
um príncipe.
- Sei. Mas não. Não coleciono
borboletas, acho que seria estranho. Um cara de 21 anos que coleciona
borboletas.
- O livro falava sobre isso
também.
- Sobre o que?
- Sobre como as pessoas se
importam com números. Tenho “tantos” anos, meu sálario é “tanto”, minha casa
vale “tanto”. Números, sabe?
- Sei. E você faz o que? Digo, da
vida?
- O que me der vontade. As vezes
nada. Não fazemos nada da vida eu acho, ela que faz da gente, então, na maioria
das vezes eu faço o que me der vontade.
- Tipo ficar sentada no ponto de
ônibus?
- É. Tipo isso.
Ele ficou pensando por algum
tempo. Avistou o próximo ônibus chegando, viu ele parar e abrir a porta, a
espero dos dois desconhecidos no ponto. Sem reação de nenhuma das
partes, o ônibus partiu.
- Aquele não era o seu ônibus? –
Ela perguntou.
- Era, mas eu estava com uns
pensamentos legais, não quis interromper.
- Ah, entendo.
E os dois sorriram.
Ei, John!
ResponderExcluirPrimeiro conto seu que leio, e eu adorei! Gostei muito da essência da garota do ponto de ônibus, porque talvez falte muito dela em nossas vidas. Como ela mesma disse, nos importamos com tanta coisa que... Nem faz tanta diferença no final. Gosto da forma como o conto ressalta, em poucas palavras, pontos que ignoramos automaticamente. Legal.
Simples, gentil. Gostei, mesmo.
Ana
nabordadocaderno.blogspot.com.br
Obrigado Ana!
ResponderExcluirFico muito feliz que tenha gostado, a sua opinião pra mim é muito importante, de verdade!